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Colegas, vamos falar sobre um tema que ninguém gosta, mas que todo médico experiente já enfrentou: a comunicação de erros médicos. Não é sobre culpa, mas sobre responsabilidade – e a forma como lidamos com isso define muito da relação médico-paciente.
Primeiro, vamos encarar a realidade: erros acontecem. Sistemas falham, protocolos são mal interpretados, a exaustão bate, e mesmo os melhores médicos cometem equívocos. O problema não é o erro em si – que pode ser minimizado com boas práticas – mas como reagimos a ele.
Já vi muitos colegas travarem na hora de comunicar um erro, seja por medo de processos, vergonha ou simplesmente falta de treinamento em comunicação difícil. E é aí que a situação pode escalar para algo muito pior.
Um estudo do Johns Hopkins mostrou que mais de 70% dos processos por erro médico poderiam ser evitados com comunicação adequada. Não estou dizendo que devemos assumir culpas precipitadamente, mas que a postura defensiva automaticamente nos coloca em rota de colisão.
Quando usei o ClínicaWork para analisar padrões de reclamações em minha clínica, descobri que 80% dos casos considerados "erros médicos" pelos pacientes eram, na verdade, falhas de comunicação sobre condutas ou expectativas.
Vamos para a parte operacional. Quando você identifica um erro – seja uma medicação errada, um diagnóstico tardio ou qualquer outra situação – eis como abordar:
1. Prepare o ambiente: Escolha um local privado, com tempo suficiente. Nada de corredores ou entre consultas. Se possível, tenha um profissional de apoio (enfermeiro, coordenador) como testemunha.
2. Comece direto ao ponto: "Sr. Silva, preciso conversar com você sobre algo importante relacionado ao seu tratamento. Identificamos que [descreva o fato de forma objetiva]."
3. Evite linguagem defensiva: Frases como "Isso acontece" ou "Não foi culpa de ninguém" soam como tentativas de minimizar. Melhor dizer: "Estou analisando como isso ocorreu para evitar que se repita."
4. Foque na solução: "Estas são as medidas que estamos tomando para corrigir..." é muito melhor que "Vamos ver o que pode ser feito."
Aqui entra a importância de um bom prontuário eletrônico. No ClínicaWork, por exemplo, temos um módulo específico para registrar comunicações difíceis, que inclui:
Isso não é para se proteger legalmente (embora também sirva para isso), mas para garantir continuidade no cuidado. Muitas vezes, outros profissionais precisarão dar seguimento ao caso.
Algumas frases que parecem inofensivas podem inflamar a situação:
Situação complicada: e quando o erro foi de um colega ou da equipe? Aqui, a regra é simples: você representa a instituição/clínica. O paciente não precisa saber de disputas internas. Apresente os fatos, as soluções, e depois resolva internamente os ajustes necessários.
Uma funcionalidade útil do ClínicaWork é o registro de incidentes com controle de acesso – permite documentar para fins de melhoria interna sem que isso conste no prontuário do paciente.
Algumas técnicas de comunicação não-violenta funcionam bem:
Validar a emoção: "Entendo que esta situação é frustrante" é melhor que "Por favor, acalme-se."
Oferecer opções: "Gostaria de discutir como podemos resolver isso. Prefere que foquemos primeiro em [A] ou [B]?"
Silêncio estratégico: Depois de dar uma informação difícil, dê espaço para o paciente processar.
Muitos conflitos podem ser evitados com:
Em resumo, comunicar erros é parte do nosso trabalho. Fazemos isso com a mesma seriedade com que damos um diagnóstico ou prescrevemos um tratamento. A diferença é que, nesse caso, estamos tratando da relação médico-paciente – um dos nossos bens mais preciosos.